Na internação, um grupo de palhaços torna a estada no hospital mais humana.
por Carina Eguía
Eles chegam em duplas ou trios. Conversam com enfermeiros, técnicos de enfermagem, médicos, equipe da limpeza e quem mais estiver passando. Entram nos quartos e brincam, na busca por levar um pouco mais de diversão e alegria para os pacientes que se encontram internados. Ao contrário do que possa parecer, a cena não se passa em um hospital infantil. Ela se desenvolve no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), centro de alta complexidade para tratamento da doença em pessoas adultas.
Os palhaços invadem as unidades de internação, à noite, três vezes por semana. Integrantes de um grupo chamado Mad Alegria, são, basicamente, alunos de segundo ano dos cursos de Medicina, Fisioterapia, Terapia Ocupacional e Fonoaudiologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). O objetivo da ação é trazer um pouco mais do bem-estar desfrutado em casa para o ambiente hospitalar, acolhendo e abrindo espaço para o conforto físico e emocional em um momento crítico provocado pelo processo de adoecimento. “É nesse clima de fantasia e de imaginação que perpassam todos os medos, as angústias e os desejos”, avalia a coordenadora de Humanização do Icesp, Maria Helena da Cruz Sponton. “Por isso é tão importante o desenvolvimento de ações que ajudem os pacientes, adultos ou crianças, a expressar seus sentimentos”.
O grupo surgiu por interesse dos próprios alunos, sendo, em grande parte, estruturado por eles mesmos. O projeto ganhou dimensão e se transformou em curso de extensão, sob o comando da professora Maria Aparecida Basile, responsável pelo Departamento de Moléstias Infecciosas e Parasitárias. Ao todo, 38 alunos – dos quais dois eram profissionais do ICESP, Jussara Alves Ribeiro, concierge do Serviço de Hotelaria e Hospitalidade do ICESP e André Migotto, psicólogo – foram os responsáveis por desenvolver, estruturar e colocar o projeto em prática. Assim, formataram os detalhes, desde a definição de visão, missão e valores, à consolidação do Estatuto Social, formação de parcerias e contratação de professor para as técnicas de claun.
Com isso, tiveram a oportunidade de receber, paralelamente à grade regular se seus cursos, uma formação mais humanista. “Uma das questões mais importantes, quando falamos do Mad Alegria, está relacionada ao desenvolvimento profissional inovador proporcionado aos jovens da área da saúde”, avalia Maria Helena. “Desde cedo, os futuros profissionais têm a oportunidade de adquirir uma nova visão sobre como realizar o atendimento. Isso os torna mais sensíveis para acolher, escutar e entender as necessidades emocionais e psíquicas, além das físicas”.
Na opinião da coordenadora de Humanização do ICESP e da professora Maria Aparecida Basile, a formação como claun concedeu aos jovens profissionais uma nova gama de ferramentas para a criação de um vínculo mais forte com os pacientes, alcançando melhores resultados terapêuticos. Dessa forma, o projeto contribui de maneira significativa na formação de profissionais com a capacidade de entender as necessidades daqueles que estão tratando, de devolver-lhe a saúde, aliando a isso uma avaliação mais holística de cada indivíduo.
De acordo com Basile, desde a criação do Patch Adams, nos Estados Unidos, e, mais recentemente, dos Doutores da Alegria, no Brasil, busca-se a humanização da assistência em saúde, promovendo uma aproximação entre profissionais e pacientes. “É interessante ressaltar que o palhaço não é o único modo de se desenvolver um trabalho como este. Qualquer atividade cultural, como música, contação de histórias ou trabalhos artesanais, que ajude a relaxar e tirar o foco do ambiente hospitalar é benéfico”.
A importância do estreitamento do vínculo entre profissionais da saúde e pacientes, humanizando as relações, também se destaca como fator de grande relevância para os alunos que participaram do curso de extensão. “Ao trabalhar nossa formação dessa maneira, somos transformados em outro tipo de profissional. Cada um de nós será capaz de estabelecer uma relação horizontalizada com as pessoas que estivermos tratando”, afirma a aluna do segundo ano de Terapia Ocupacional, Amanda Manso. “É isso o que buscamos: ver as pessoas de uma forma diferente, integral”, explica.
Professores e profissionais concordam que este tipo de experiência desperta a sensibilidade do profissional de saúde. “Passamos a enxergar de outra forma como a doença afeta a vida não só do paciente, mas da família inteira. E eles também, quando nos veem vestidos de palhaços não nos enxergam em uma posição superior. Por isso é possível estreitar os vínculos”, explica Aline Jimi Myung Cho, aluna do curso de medicina.
Profissionais experientes também encontram na atividade uma forma de resgatar o bem-estar, a autonomia e a autoestima. André Migotto, psicólogo do ICESP que participou do curso, acredita que, assim, é possível trazer um pouquinho do bem-estar e da alegria de casa para o hospital. “O ambiente fica mais leve porque há espaço para a descontração e a diversão, ainda que em momento de crise”, avalia.
Para Aline, a atuação do palhaço com o paciente promove uma mudança instantânea no local. “Quando entramos no leito e o paciente ou o acompanhante estão meio prostrados, com uma conversa simples, às vezes umas brincadeiras, o clima muda completamente. Isso é muito gratificante”.
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